sábado, 1 de maio de 2010

Roça, Roça, Roça



Sítio, roça, fazenda... bons lugares pra se visitar, espairecer, ficar com os parentes e amigos, descansar e curtir a paisagem, né?

Não, esses lugares definitivamente não são bons pra nada disso. Não se a sua família for tão doida quanto a minha.

Tudo na minha casa já começa com jeito de que vai dar errado.
É incrível como as mulheres são. Minha mãe começa a arrumar a mala da viagem uma semana antes, parece que ela vai passar 9 meses no Alasca. E mesmo assim até o último momento ela tá tentando enfiar coisas na bolsa.
Meu pai por sua vez, pega uma sacolinha do epa (ou do extra quando a gente tá mais chique) põe dentro dela 4 laranjas, 3 bananas e uma faca. E SÓ. Não sei de onde aparecem as roupas que ele usa durante a viagem.
Já a minha irmã eu não sei como é o procedimento com ela, só sei que uma hora lá ela aparece pronta e boas.
Eu, por outro lado, sou uma topeira. Não adianta, eu tento prestar atenção nas coisas que eu faço, mas sempre esqueço as coisas mais óbvias; tipo chinelo, escova de dentes, travesseiro, etc.

Momentos antes da partida minha mãe pergunta ao meu pai se ele já fez a revisão, alinhou o carro, essas coisas; e o lindão responde "claro que não, pra quê?". COMO PRA QUÊ? Pra nada, só porque vamos viajar 200km, passar por estradas de terra, curvas sinuosas, num mundo totalmente desconhecido e cheio de perigos.
Nem precisa falar que na estrada é só emoção, né?! Escapamentos em curvas, fugas de blitz policiais, esquecimento do caminho, atolamentos na estrada de terra, colisões com cavalos e bois, etc.

Finalmente chegamos! Oh yeah! Antes a gente atravessava o riachinho e deixava o carro bem perto da casa, até o dia que o carro empacou e nunca mais saiu da água. Depois passamos a deixar na margem do rio, até quando rolou uma chuva cabulosa, from hell, inundou o bagulho todo e o carro foi levado pela correnteza do rio pra sempre. Agora a gente deixa o carro longe da margem pra não ter mais esse problema, consequentemente temos que andar uns 2km até chegar na casa. atravessando o rio a pé e com 50mil coisas na mão. Maravilha, né?

Pois é, já instalados na (in)cômoda casa passo a conviver com o pique inconveniente dos meu primos mais novos: "ah, Lucas, vamo nadar", "vamo jogar bola","vamo andar de cavalo", "vamo lá no sítio do seu Geraldo". Sério, tô envelhecendo, não tenho mais a empolgação que outrora tive na juventude, só posso sugerir de brincar de quem dorme mais rápido.
Percebendo que não vão conseguir me tirar do ócio, eles vão caçar o rumo deles e eu volto a fazer o que eu tava fazendo, ou seja, nada.

Quando eu já tô até sonhando começo a ouvir burburinhos contra a minha pessoa. Sempre começa com a minha vó, que não é a forrozeira (já falei sobre ela aqui) "ô Zezé (meu pai), esse seu minimo deve tá cum verme, tá numa forga". Ela sempre me chama de 'minimo' porque simplesmente custa a lembrar meu nome, e olha que ela é minha madrinha de batismo.
Depois que a minha vó falou, acabou a paz. Todas as outras tias começam a dar seus pitacos, minha mãe fala que eu não posso ser preguiçoso desse jeito, minhas primas falam que eu tenho que andar pra ficar forte e crescer (de onde elas tiraram isso?). Diante de tamanha pressão meu pai se vê obrigado a fazer alguma coisa e me chama pra ir buscar lenha com ele.

Vai tomar no cu! Por que eu simplesmente não posso deitar e dormir? Eu só vou na roça pra isso. Não quero apreciar a natureza, não quero respirar ar puro, não quero contar estrelas do céu. Não curto nada dessas coisas. Eu só quero virar pra parede e morrer. Por que ninguém pode aceitar isso?

Okay... levanto puto da vida pra ir buscar a tal da lenha com o meu pai. Detalhe é que quando ele fala pra nós buscarmos lenha eu realmente acredito que iremos fazer a tarefa juntos. Ele e eu. Que inocência a minha! Meu pai inexplicavelmente se perde no meio do caminho e eu tenho que fazer a coleta de lenha toda sozinho.

Notando que levaria uma vida de escravo perto dos meus pais e dos outros familiares, resolvo compartilhar do espírito de aventura dos meus primos.
Primeiramente eles me chamam pra ir ao rio, molhar a bundinha. Eu só penso como eles tem tanta coragem de entrar naquela água friiaaa, naquele tempo friiooo e ainda por cima fazer aquela carinha de quem tá gostando demais. É muita adrenalina pra mim. Quando finalmente surgem os raios de sol atrás das nuvens me jogo no piscinão natural. Depois que eu mergulho sempre tenho a sensação que vou virar um picolé humano e me pergunto por que fui tão idiota pra mergulhar naquela água molhada e gelada.

E quando a galera cisma de ir à cachoeira? O fato é que eu sempre duvidei que existia mesmo uma cachoeira nessa terra longínqua, um dia quiseram me provar que a tal de fato existia. Só não me contaram que tinha que percorrer uma maratona pra chegar lá. Puta merda, que lugar longeeeee, meu Deus. Quando a gente chegou lá eu nem queria ver mais porra de cachoeira nenhuma, só queria deitar numa pedra e dormir pra sempre. O pior é que quando deitei uma tia já foi falando "que menino frouxo, senhor". O detalhe é que a pilantra foi de carro. Fui um dos únicos desbravadores que fizeram o caminho a pé.

Outra coisa que me aborrece quando vou pra roça: a comida. Minhas tias coziam bem pra caralho, mas elas são de uma religião aí e nem comem carne, nem coziam carne, nem encostam em carne, nem falam a palavra carne. Aí eu tenho que passar os dias comendo coisa verde, um tal de 'imbigo de banana', miojo de legumes, biscoito maizena, cevada, biscoito de polvilho, etc. Na verdade eu até gosto dessas coisas, menos biscoito de maizena. Acontece que eu sou um homem das cavernas praticamente, eu preciso de carne. Simples assim. Eu peço pra minha mãe fritar um bifinho, mas ela diz que é falta de respeito com as minhas tias. Na verdade acho que é só uma desculpa pra ela não se dar ao trabalho.

Usar o banheiro também é um problema. Chego lá, observo a situação e dou um grito: "Pô, por que que esse banheiro tá fedendo tanto?" Aí me respondem que tá assim porque não dá pra dar descarga toda hora, a caixa d'água tá estragada, só rola de puxar a cordinha quando se faz cocô. Olha que coisa absurda! Sempre tem alguma coisa que não tá funcionando direito. Por que que a gente paga um caseiro afinal de contas? Um dia é o banheiro, outro dia é a energia elétrica, outro dia é o gás do fogão, impressionante!

A pior parte é quando o meu pai cisma de me transformar num homem do campo. Me põe pra cortar lenha, ordenhar e tirar leite de vaca, colher limão, cuidar das galinhas e afins. Mas o mais triste foi quando ele me colocou pra plantar milho. PUTA QUE PARIU! Nunca trabalhei tanto nessa minha vida. Arar, enxadar, por semente, colocar fertilizante, fechar buraco e tudo mais. Você não tem noção de quanto suas pernas e costas doem.
E quando ele decide que eu tenho que ir pegar banana no tal do sítio do seu Geraldo? Ele me dá um facão, um saco e um garfo e me diz "você sabe que lá tem uma cobra, né? Se precisar, você dá uma garfada na cabeça dela." Porra, como assim? Eu não sou o Indiana Jones.
Eu odeio desapontar meu pai, sabe? Mas ele tem que entender que eu não sou um vaqueiro. Eu vivi minha vida toda na cidade grande, não vou virar um roceiro da noite pro dia.

Cara, eu adoro andar a cavalo. Mas por que os cavalos nos quais ando têm que ser tão temperamentais? Se você dá uma porradinha no popozão, ele fica todo ofendidinho, aí ou ele tenta te matar, saindo correndo loucamente e sem destino ou simplesmente empaca. Um dia ele cismou que não queria atravessar o rio, o mesmo rio que levou o carro embora durante a chuva, olha que charme desse eqüino! Eu tive que descer do quadrúpede folgado e praticamente carregar ele nas costas pelo caminho de volta.

A hora de dormir também é um caos. Um amontoado de colchões espalhados pelos cômodos, aquela fumaça de fogão de lenha acumulada do dia todo entrando pelo nariz. Sempre tem um parente engraçadinho que fica soltando uns peidos monstros e rindo pra caralho com isso. Se você faz isso, você é um viado, corno, filho da puta. Isso não é engraçado. É patético.
Também sempre tem alguém doente que fica a noite toda suando o nariz, alguém que sempre ronca igual a um porco e uns vaga-lumes (ou vagalumes, sei lá) que aterrisam na sua testa. Enfim, você nunca tem uma noite de sono boa. E na manha seguinte, na melhor parte do sono, seus primos pentelhos te acordam as 6:30 da madrugada pra começar um novo dia de aventura. Uoooowww! Bacana, hein?

Na hora de voltar é a mesma emoção da ida, com o agravante do carro estar num estado um pouco pior. Sem contar que ninguém abastece o carro e ainda se perguntam "como assim a gasolina acaba no meio da estrada? Não é possível a gasolina ter acabado tão rápido?" Porra, nós tamo andando 350km sem abastecer, é claro que essa merda vai acabar.

Ahhh... fim de post também. Já falei demais. Adeus!